Quando tinha nove anos, Berta de Nazareth perdeu a sua mãe, que foi vítima de feminicídio. Naquela altura, ela não entendia termos como "patriarcado" ou "desempoderamento" – conceitos com os quais lida todos os dias no seu trabalho como activista pelos direitos das mulheres. Tudo o que sabia era que a sua família havia sido dilacerada pela violência.
Contudo, ao crescer, a Berta, que tem hoje 25 anos, começou a reparar que as mulheres eram tratadas de forma diferente dos homens. Durante a sua adolescência em Maxaquene, um bairro em Maputo, a capital moçambicana, era esperado que ela se vestisse e comportasse com modéstia. Por outro lado, os rapazes podiam fazer o que quisessem. "A forma como uma mulher deve comportar-se na sociedade ou perante o seu parceiro está repleta de regras e restrições", diz ela. "Mas nada é proibido ou restrito aos homens."
Ela também reparava na forma perversa como a sociedade justificava e legitimava a violência contra as mulheres. "Na maioria dos casos, a sociedade tem sido perdoadora e apática", diz ela. “Dizemos coisas como: ‘Ela foi violada – onde estava? O que fazia? O que vestia?'"
A vida da Berta mudou em 2010, quando começou a participar em sessões de capacitação com organizações de direitos das mulheres sobre normas de género e violência. "Só então entendi o que havia acontecido [com a minha mãe] e as razões por detrás disso", diz ela. “Desde o momento em que tomei consciência, comecei a participar no activismo social. É por isso que hoje me considero um activista social pelos direitos humanos das mulheres.”
Hoje, a Berta é facilitadora de género na Associação Sociocultural Horizonte Azul (ASCHA), uma organização feminista à qual se juntou após a morte da sua mãe. A ASCHA ajuda crianças e adolescentes vulneráveis, ajudando-os a permanecer na escola e envolvendo-os em actividades artísticas como dança, poesia, fotografia e encadernação de livros. A organização também realiza actividades de sensibilização sobre igualdade de género e saúde e direitos sexuais e reprodutivos. Muitas das actividades focam-se nas meninas e raparigas, que muitas vezes são forçadas a abandonar a escola devido às uniões prematuras ou à gravidez precoce – 48 por cento das raparigas moçambicanas são casadas ou estão numa união antes dos 18 anos. Elas também são vulneráveis à violência, pois uma em cada quatro mulheres moçambicanas sofrem violência durante a sua vida.
Apesar do trauma que sofreu na infância e das dificuldades financeiras, a Berta formou-se na Universidade Pedagógica de Moçambique e hoje lidera um grupo de 12 mentoras da ASCHA, capacitando outras jovens a superar muitos dos problemas que encontrou durante sua própria adolescência.
"Junto com outras mulheres, posso plantar as sementes para a mudança de atitude e comportamento", diz ela. “Quero que Moçambique seja um país onde as mulheres tenham autonomia. Onde as mulheres possam falar por si próprias, ser respeitadas e, acima de tudo, tratadas como seres humanos.”
A Berta está determinada a transformar o seu sonho em realidade.
"Isto pode parecer uma utopia, mas acredito que podemos alcançá-la", diz ela. "O que me motiva são todas as mulheres e raparigas que precisam do meu apoio. São todas as raparigas vulneráveis, amordaçadas ou silenciadas. Elas inspiram-me levantar todas as manhãs e continuar a minha caminhada.”
A Iniciativa Spotlight ajuda activistas como a Berta de Nazareth a capacitar mulheres e raparigas para exercerem os seus direitos. Nós estamos #WithHer. E você?
Artigo original pela Iniciativa Spotlight