Quebrando Barreiras: Saúde e Proteção para Pessoas com Deficiência
03 dezembro 2025
Legenda: Retrato de Alima Saide, que vive na zona de Natite e sempre frequentou este centro de saúde. Ela perdeu a perna num acidente de carro há alguns anos e, antes de o centro ter uma rampa, tinha dificuldade em aceder ao mesmo.
Com apoio das Nações Unidas, pessoas com deficiência têm acesso equitativo à saúde sexual e reprodutiva e à proteção contra a violência de género em Moçambique.
MAPUTO, Moçambique - O acesso a serviços de saúde sexual e reprodutiva (SSR) e violência baseada no género (VBG) é um direito humano fundamental, mas em Moçambique, as pessoas com deficiência enfrentam desafios significativos e complexos relacionados com esse acesso. Estas barreiras são multifacetadas, variando desde a inacessibilidade física até preconceitos sociais profundamente enraizados.
O problema: uma teia de obstáculos
O acesso limitado aos serviços deve-se a várias barreiras críticas:
Distância física e transporte: Longas distâncias até clínicas e centros de serviços, juntamente com uma grave falta de transporte acessível e económico;
Má qualidade e acessibilidade dos serviços: muitas instalações existentes são fisicamente inacessíveis (sem rampas, corrimãos ou dispositivos auxiliares). Além disso, há falta de pessoal que saiba usar linguagem gestual ou fornecer materiais em braille ou linguagem de fácil leitura; e
Discriminação e falta de conhecimento: os prestadores de serviços muitas vezes não têm consciência dos desafios associados às deficiências e nutrem atitudes e crenças discriminatórias, o que prejudica gravemente a qualidade dos cuidados.
Legenda: Angelina Bernardo Mague estuda o Álbum Seriado durante a sua consulta de planeamento familiar no Centro de Saúde de Natite. A ferramenta visual ajuda a colmatar lacunas de comunicação e apoia a sua compreensão das informações que estão a ser partilhadas.
A intersecção da vulnerabilidade: mulheres e raparigas com deficiência
Mulheres e raparigas com deficiência enfrentam desafios únicos devido à intersecção entre o seu género e a sua deficiência. Isso muitas vezes significa que lhes é negado o direito de tomar decisões sobre a sua própria saúde sexual e reprodutiva.
Esta maior vulnerabilidade resulta em riscos mais elevados de:
Violência sexual e baseada no género;
Gravidezes indesejadas;
Abortos inseguros; e
Infecções sexualmente transmissíveis.
O isolamento social e familiar aumenta ainda mais o risco. Muitas vezes, essas pessoas ficam escondidas em casa e não têm apoio da comunidade. Embora a subnotificação de violência de género seja comum em Moçambique, as barreiras à mobilidade, comunicação e o isolamento severo agravam a situação das pessoas com deficiência, que também podem sentir vergonha ou culpa, especialmente quando o agressor é um membro da família ou cuidador.
Legenda: A Sra. Albertina Lasma acede aos serviços de saúde sexual e reprodutiva e violência baseada no género na Unidade de Saúde de Natite, após chegar à área de consulta através da rampa de acessibilidade recentemente instalada, ilustrando o impacto de infraestruturas inclusivas e da prestação de serviços orientada por procedimentos operacionais padrão.
A solução: ferramentas inclusivas e procedimentos padronizados
Para resolver esta lacuna crítica e tornar os serviços mais inclusivos, o UNFPA estabeleceu uma parceria com a organização da sociedade civil AIFO – Associazione Italiana Amici di Raoul Follereau, em 2024. Esta colaboração teve como objetivo equipar os prestadores de serviços com conhecimentos e ferramentas práticas e detalhadas.
O Que Foi Desenvolvido?
O projeto resultou de um rigoroso processo de consulta com pessoas com deficiência, cuidadores, prestadores de serviços e setores governamentais. Os principais recursos incluem:
Álbum Seriado: uma ferramenta vital para comunicação alternativa e aumentativa. Este álbum facilita a interação entre prestadores e pessoas com dificuldades de comunicação, incluindo pessoas surdas, com deficiências auditivas ou intelectuais, ou indivíduos que temporariamente apresentam dificuldade para falar (por exemplo, devido a trauma).
Fase Piloto e Próximos Passos
Após aprovação do governo, os POPs foram testados durante quatro meses em três províncias — Maputo (sul), Manica (centro) e Cabo Delgado (norte) — tanto em unidades de saúde como em centros de atendimento único para vítimas de violência baseado no género.
Legenda: Retrato de Angelina Bernardo Mague, uma adolescente com síndrome de Down que frequenta os serviços de planeamento familiar na Unidade de Saúde de Natite. Ela tem algumas dificuldades de comunicação, e o prestador de serviços optou por usar o Álbum Seriado.
Os prestadores de serviços receberam formação intensiva sobre a utilização dos POPs, do Manual e do Álbum Seriado.
Representantes de Organizações de Pessoas com Deficiência (OPDs) foram contratados para criar ativamente procura pelos serviços e monitorizar o progresso da implementação.
É evidente nesta fase que o impacto é positivo e significativo, com benefícios diretos para a qualidade de vida da população e para o fortalecimento de um sistema mais justo e inclusivo. Com este programa, a qualidade da prestação de serviços melhorou, conquistando a confiança da população — especialmente das pessoas com deficiência — que agora tem muito mais facilidade para acessar os serviços devido à remoção das barreiras.
Como explicou Eunice Lacastre, psicóloga clínica do Centro de Cuidados Integrados de Chimoio, “as principais conquistas que observámos com a implementação deste projeto incluem a capacidade dos profissionais de desenvolver uma abordagem inclusiva, aprendendo a lidar com cada tipo de deficiência, e a implementação de materiais de comunicação inclusivos".
"Antes do início do projeto, não recebíamos pessoas com deficiência nos nossos serviços porque elas tinham medo de vir devido às barreiras existentes. Agora, temos visto um aumento na procura por serviços por parte de pessoas com deficiência", afirmou a psicóloga Eunice.
*O programa GDF Parceria para a Realização dos Direitos das Pessoas com Deficiência em Moçambique, implementado conjuntamente pela UNICEF, UNFPA e OHCHR, financiou a fase de desenvolvimento dos POPs e do Manual Operacional, enquanto o programa regional GDF Cuidados Não Remunerados, Deficiência e Abordagem Transformadora de Género, implementado conjuntamente em Moçambique pelo PNUD, UNFPA e ONU Mulheres, financiou a fase piloto.