Ativista aponta falta de investimento para avanço da equidade de gênero em Moçambique
Whitney Sabino, ativista moçambicana, destaca falta de financiamento para políticas de gênero em Moçambique durante sessão da CSW na ONU.
NOVA IORQUE, EUA - Em Moçambique, falta investimento para implementar medidas para avançar na equidade de gênero. A avaliação é da ativista moçambicana Whitney Sabino, que esteve na sede das Nações Unidas em Nova Iorque para 68ª sessão anual da Comissão sobre o Estatuto da Mulher, CSW.
Ela conversou com a ONU News sobre seu trabalho no país africano com meninas e mulheres e avaliou o cenário do progresso da agenda de gênero. Para ela, enquanto o machismo e o patriarcado parecem ser “autofinanciados”, os recursos para apoiar políticas de gênero são limitados.
Barreiras para igualdade de gênero
A líder da organização juvenil “Manas” busca impulsionar iniciativas de capacitação e criar espaços para o empoderamento feminino em Cabo Delgado, região que vem sofrendo com conflito e com as consequências de consecutivos desastres climáticos.
Whitney Sabino opina que as principais barreiras para o avanço da igualdade de gênero em seu país vêm de normas sociais e baixo financiamento para empoderar mulheres tanto na frente política e social, como no aspecto econômico.
“As principais barreiras têm que ver com as normas sociais, a nossa cultura, alguns hábitos tradicionais que permanecem e levam, por exemplo, aos casamentos prematuros ou as uniões forçadas; a lei do combate às uniões forçadas e prematuras em Moçambique é recente, de 2019. Também diria que há questões estruturais que têm que ver com financiamento. É preciso falar disso. Esta mudança tem custos altíssimos. Eu costumo dizer que o machismo, o patriarcado, reinventa-se com muita facilidade e é como se ele fosse autofinanciado. E nós vamos na contramão deste “sistema” [...] Moçambique tem um quadro legislativo político que é dos mais progressistas a nível de África. Mas a implementação é deficitária, em parte por causa da questão das infraestruturas e do financiamento”.
Além da questão financeira, Whitney Sabino avalia que Moçambique precisa investir no sistema de proteção dos direitos humanos de mulheres e meninas. Ela lembra que elas foram afetadas duramente com os ciclones e sofrem diversas formas de violência baseada no gênero.
Futuro da igualdade de gênero em Moçambique
A ativista moçambicana afirma que a caminhada do progresso feminista no país é “feita de sonhos que vão se tornando realidade”. Ela numerou uma série de conquistas no país e espera fazer parte da concretização de outros “sonhos coletivos”.
“Há pesadelos no percurso, mas são sonhos que se vão tornando realidade. Hoje, em Moçambique, na região, no continente, temos muitas coisas que não tínhamos, que eram só um sonho. Ter uma lei a famosa 29/2009, que é a Lei da Violência baseada no gênero em Moçambique, já foi sonho, desde 1995, em Beijing (Pequim), ano que eu nasci. Sonho das veteranas, das mães, mulheres ativistas que na altura participaram da conferência e que estavam a lutar por isto. Mas para mim é uma realidade hoje esta lei e ajuda muito. E é com base nela que eu e outras mulheres jovens fazemos advocacia, levamos a violadores a barra da justiça e tudo isso era um sonho. Uma lei do combate às uniões forçadas de prematuros também já foi sonho. Uma estratégia de gênero, uma política de gênero nacional que propicia ou que promove a mulheres em cargos de liderança e tomada de decisão, também já foi sonho. Vale a pena sonhar a olhar por este exemplo de Moçambique, por estes avanços que vamos tendo”.
Atualmente, na Assembleia da República, as deputadas representam 42% dos 250 membros do órgão, além de ser liderado por uma mulher. O país também já foi reconhecido na ONU por ter alcançado igualdade em cargos ministeriais em 2022.
Situação humanitária
No terreno, o trabalho de Whitney Sabino e outros parceiros humanitários seguem essenciais para responder a crise no norte do país, especialmente em Cabo Delgado e Nampula.
Segundo dados da ONU, o país precisa de financiamento adicional para a resposta humanitária. Além da tempestade Filipo, que atingiu a região central e o sul do país, a nação já está enfrentando sua segunda maior crise de deslocamento desde 2017 na província de Cabo Delgado, onde mais de 120 mil pessoas foram deslocadas por uma nova onda de violência entre fevereiro e março.
O Plano de Resposta Humanitária para este ano, que exige US$ 413 milhões, tem pouco menos de 6% de financiamento, com US$ 23 milhões.