Reduzir a desigualdade energética: Inovar um mercado sustentável em contextos de deslocação
05 dezembro 2023
MAPUTO, Moçambique - A Organização Internacional para as Migrações (OIM), em parceria com a NORCAP e com o apoio da Innovation Norway, embarcou numa iniciativa inovadora para estabelecer um mercado sustentável de energia limpa em ambientes de deslocamento em Moçambique. Este projeto transformador procura abordar as barreiras que impedem o acesso a serviços energéticos essenciais para as populações deslocadas, ao mesmo tempo que aborda os obstáculos enfrentados pelos actores privados ao entrar neste mercado negligenciado.
"Normalmente, demoro uma hora para ir ao mato, apanhar lenha e voltar", explica Francisca, uma deslocada interna na província de Sofala.
Em zonas onde as pessoas foram forçadas a abandonar as suas casas, a falta de acesso à eletricidade e a alternativas ao combustível tradicional para cozinhar afeta significativamente a vida das pessoas deslocadas internamente (PDI), levando a um aumento das dificuldades e dos riscos de violência baseada no género. A escassez de combustível tradicional para cozinhar obriga as mulheres a percorrer longas distâncias para recolher lenha, aumentando os riscos de agressão. Além disso, a iluminação inadequada das zonas onde vivem os deslocados internos faz com que as pessoas se sintam inseguras à noite para passear e utilizar os serviços comunitários, como os mercados e as latrinas comunitárias. Esta situação representa uma ameaça ao ecossistema ambiental e pode também levar a relações tensas com as comunidades acolhedoras devido a uma maior concorrência por recursos limitados e à perceção de uma sobrecarga das infra-estruturas e serviços locais.
Apesar de o sector humanitário reconhecer que o acesso à energia sustentável é uma prioridade, de acordo com o Relatório sobre o Estado do Sector da Energia Humanitária (2022), cerca de 94% das pessoas deslocadas nos campos a nível mundial ainda não têm acesso à eletricidade e 81% dependem da lenha e do carvão para cozinhar. Além disso, os produtos e serviços básicos de energia são frequentemente fornecidos por meio de assistência humanitária, perturbando potencialmente as economias locais.
As barreiras económicas têm historicamente impedido as populações deslocadas e as comunidades de acolhimento de acederem aos serviços energéticos necessários e os riscos percebidos têm desencorajado os actores privados de entrar neste mercado e de fornecer soluções viáveis. Esta iniciativa procura criar um ambiente propício que permita a todas as partes interessadas participar activamente na construção de um mercado sustentável para soluções energéticas mais limpas.
Em 2022, o projeto iniciou a sua fase piloto, que envolveu os utilizadores finais através de avaliações energéticas, de mercado e financeiras. As oficinas de co-design com deslocados internos reuniram ideias e aspirações, resultando em soluções personalizadas para os cinco locais de reassentamento de deslocados internos na província de Sofala, Moçambique, abrigando cerca de 10.000 pessoas. Para melhor enquadrar o projeto, a OIM organizou duas sessões de Diálogo de Mercado online com diferentes partes interessadas, incluindo o sector privado, para uma troca aberta de ideias e identificação de desafios recorrentes no sector de energia. Os conhecimentos adquiridos nestas sessões serviram de base para a elaboração de um concurso de propostas para parcerias inovadoras, convidando potenciais parceiros a apresentar propostas que abordassem o desafio multidimensional do acesso à energia nos locais de reassentamento.
"O compromisso da OIM com soluções duradouras para as populações deslocadas tem uma forte representação neste projeto. Ao abordar a questão do acesso à energia limpa, lançamos as bases para a resiliência sustentável, o empoderamento e um futuro mais brilhante e seguro." Disse a Dra. Laura Tomm-Bonde, Chefe de Missão da OIM em Moçambique.
Como resultado deste concurso, a OIM fez uma parceria com a C-Quest Capital e um consórcio composto pela Green Light Africa, Mercy Corps e Epsilon Energia Solar. A C-Quest Capital fornecerá formações para a construção e manutenção de fogões melhorados, combinadas com um kit JetFlame concebido para melhorar a combustão dos combustíveis para cozinhar. Enquanto isso, o consórcio introduzirá sistemas solares domésticos nos mercados e estabelecerá um fundo de subsídio para o uso produtivo de energia. O projeto também incentivará as comunidades a investirem em Associações de Poupança e Empréstimo da Aldeia (VSLAs), que são soluções financeiras baseadas na comunidade que fornecerão os meios financeiros necessários para as famílias investirem em sistemas solares domésticos.
Além disso, a OIM e a C-Quest Capital estão a explorar a possibilidade de desenvolver indicadores de impacto para comprovar a existência de créditos de carbono de elevada integridade e impacto. O objetivo é potencialmente comercializar esses créditos como um catalisador para a adoção de soluções de energia sustentável, promovendo um futuro mais verde.
A OIM prevê o desenvolvimento de um modelo de entrega global para as melhores práticas, com o objetivo final de ampliar e replicar esta iniciativa no futuro. Esta abordagem inovadora tem o potencial de revolucionar o acesso ao financiamento, à tecnologia e ao reforço das capacidades do sector privado e dos utilizadores finais das soluções energéticas sustentáveis. Ao quebrar barreiras, inspirar parcerias e capacitar as comunidades, podemos inaugurar coletivamente um futuro mais verde e sustentável.
"O acesso a energia mais limpa significa acesso a oportunidades e a uma vida mais saudável. Com um número recorde de deslocações em todo o mundo, temos de ser mais céleres e eficientes a levar energia limpa às comunidades afectadas. Os recursos e a dinâmica necessários para satisfazer as necessidades energéticas a nível mundial de uma forma ecológica só são possíveis através da criação de novas abordagens e do trabalho em parceria com o sector privado, a sociedade civil e o mundo académico", afirma Eva Mach, Responsável pela Unidade de Sustentabilidade Ambiental da OIM.
Lambo Jose, Country Manager da C-Quest Capital em Moçambique, explica: “O ‘fogão poupa lenha’ ou fogão a lenha foi projetado para uso em áreas desmatadas. Em certas comunidades onde vamos trabalhar, a escassez de árvores obriga os membros da comunidade, especialmente as mulheres, a fazer longas viagens para recolher lenha. Além de reduzir drasticamente a quantidade de madeira necessária para cozinhar, outra vantagem da ‘fogao poupa lenha’ é sua construção usando materiais disponíveis localmente, como argila, areia e adubo”.
