Megafones e máscaras: activistas adaptam-se à COVID-19 em Moçambique
12 agosto 2020
Durante a pandemia, activistas comunitários encontram formas criativas para alcançar as mulheres e raparigas mais vulneráveis.
Nampula, Moçambique – Munida de um megafone, máscara e luvas, Denardina Mussa, de 25 anos, tem uma missão: incentivar mulheres e raparigas a denunciar a violência durante a pandemia da COVID-19.
A Denardina começou a trabalhar como activista há cinco anos. Ela tinha ouvido muitas histórias de raparigas que tinham sofrido violações sexuais, sido forçadas a uniões prematuras ou mesmo assassinadas na sua província de Nampula, em Moçambique, e decidiu agir.
No ano passado, a Denardina juntou-se a uma equipa de mais de 50 activistas da organização Ophenta, apoiada pela Iniciativa Spotlight, que realiza campanhas de sensibilização porta-a-porta para educar as comunidades sobre a violência sexual e baseada no género. Estas campanhas estão actualmente suspensas para ajudar a conter a propagação da COVID-19, mas activistas como a Denardina estão determinadas a alcançar as suas comunidades, aconteça o que acontecer. Estas activistas agora caminham ou conduzem através dos bairros da Cidade de Nampula com megafones, disseminando mensagens sobre prevenção e denúncia da violência sexual e uniões prematuras. Durante as campanhas, as activistas também partilham números de telefone para linhas de apoio e distribuem folhetos para informar as mulheres sobre onde encontrar apoio e serviços.
Os meios de comunicação em massa desempenham um papel crítico durante as crises, mas nem sempre são a forma mais eficaz para alcançar grupos com acesso limitado à tecnologia. Mas com megafones, as activistas sabem que podem comunicar com diferentes grupos, incluindo mulheres e raparigas, em línguas locais.
MUDANDO UMA MENTE DE CADA VEZ
O receio pela sua própria segurança e a resistência das comunidades são as partes mais difíceis do trabalho da Denardina.
“Muitas pessoas não querem reconhecer a violência sexual”, explica ela.
“Recebemos ameaças de violação nas ruas”, diz outra activista, Shamita Martins, de 22 anos. Mas isso não as impede de fazerem o seu trabalho. Líderes comunitários treinados pela Ophenta na prevenção da violência de género acompanham activistas como a Denardina nas passeatas pelos seus respectivos bairros, contribuindo para a segurança das activistas e mostrando o seu apoio às mensagens disseminadas.
A província de Nampula é a mais populosa de Moçambique, onde 62 por cento das raparigas são forçadas a uma união antes dos 18 anos, muito acima da média nacional de 48 por cento.
“A violência doméstica e sexual é comum e tolerada aqui por ignorância, mas agora estamos atentos”, diz Carlos António Dinis, de 64 anos, um dos 35 líderes comunitários formados no ano passado.
A transformação das normas sociais é lenta, mas a Denardina sabe que está a lançar sementes para as gerações futuras e já vê algumas mudanças.
“Nós já dissuadimos famílias que estavam prestes a forçar suas filhas menores a casar, e essas meninas agora estão reintegradas na escola”, diz a Denardina.
Ela também ajuda as comunidades a compreender que existem leis que protegem as mulheres e as raparigas contra a violência e as uniões prematuras. “Os membros comunidade estão a começar a entender que, se cometer estes crimes, podem acabar na cadeia”, disse Omar Abacar, de 55 anos, outro líder comunitário.
UMA MÁSCARA E UMA MENSAGEM
A Denardina também participa em campanhas de prevenção da COVID-19 realizadas em terminais de transportes públicos, distribuindo máscaras a mulheres, crianças e idosos. Com cada máscara, ela transmite uma mensagem vital: “Use esta máscara para se proteger da COVID-19 e não para se silenciar. A violência é crime, denuncie!”
No ano passado, as activistas da Ophenta sensibilizaram mais de 3.700 na cidade de Nampula. Estas encontram-se entre os mais de 29.000 indivíduos alcançados por intervenções apoiadas pela Iniciativa Spotlight nas três províncias-alvo do programa, para informar comunidades sobre a violência baseada no género, as uniões prematuras e os serviços de resposta existentes.
A partilha de informação, por sua vez, faz aumentar a procura por serviços de apoio. Para garantir que as sobreviventes de violência continuam a ter acesso a serviços essenciais durante a pandemia, a Iniciativa Spotlight está a equipar equipas governamentais nos sectores da saúde, acção social, polícia e justiça com equipamentos de proteção individual e materiais de higiene, bem como a fornecer telefones celulares, veículos e clínicas móveis a instituições públicas, além de apoiar capacitações virtuais para prestadores de serviços.
A Iniciativa Spotlight é uma parceria global entre a União Europeia (EU) e as Nações Unidas (ONU) para eliminar todas as formas de violência contra as mulheres e raparigas. Em Moçambique, a Iniciativa é liderada pelo Governo, sob a tutela do Ministério do Género, Criança e Acção Social. É implementada ao longo de um período de quatro anos (2019-2022) com um compromisso de $40 milhões de dólares da UE, com foco nas áreas prioritárias de acção para o combate à violência sexual e de género, eliminação das uniões prematuras e promoção dos direitos sexuais e reprodutivos de mulheres e raparigas.
*A Ophenta (que significa “amar” ou “cuidar” na língua Emakhuwa) é uma associação que apoia mulheres e raparigas vulneráveis, com sede em Nampula. No âmbito da Iniciativa Spotlight, a Ophenta realiza intervenções de mobilização social – como teatro comunitário e campanhas em bares, mercados e terminais de transportes públicos – para educar as comunidades sobre a violência sexual e de género. A Ophenta faz parte do Consórcio Contra a Violência Sexual, uma parceria de sete organizações de mulheres que trabalham para prevenir a violência sexual e de género no âmbito da Iniciativa Spotlight.