“Escolhemos a maternidade, porque quem vai dar à luz aqui somos nós”
Diz Teresa Wilson, membro do conselho consultivo local de Chokwe, Província de Gaza. Com o apoio da LoCAL, Moçambique luta contra as mudanças climáticas.
MAPUTO, Moçambique - Desde que Almeira Nhagumbe, enfermeira de 49 anos, lembra-se, a comunidade de Djodjo, no distrito de Panda, Província de Inhambane, Moçambique, tinha uma cabana improvisada de caniço com telhado de palha como clínica de saúde e maternidade .
“Não tínhamos eletricidade e fazia muito calor, só havia uma sala para tratarmos os pacientes e para as grávidas darem à luz”, afirma Almeira.
“Tínhamos que usar telefone ou lanterna para assistir aos partos; e se eu estivesse sozinha, tinha que colocar o telefone na boca enquanto ajudava as mães e os bebês” - Enfermeira Almeira Nhagumbe.
Agora, graças ao Local Climate Adaptive Living Facility (LoCAL), liderado pelo Governo de Moçambique, e com o apoio técnico do Fundo das Nações Unidas de Desenvolvimento de Capital (UNCDF), a população de Djodjo e das comunidades vizinhas podem se beneficiar de uma clínica de saúde resiliente e maternidade, onde os serviços de saúde sexual e reprodutiva podem ser prestados de forma digna.
“Neste novo edifício temos tudo o que as mães e as crianças precisam; antes éramos uma equipe de apenas uma enfermeira e um técnico de saúde, agora somos compostas por seis pessoas”, comenta Almeira enquanto uma gestante aguarda sua consulta.
“Os pacientes estão chegando em massa e estamos realizando 12 partos por mês, em vez de dois partos por mês antes da inauguração da clínica”, afirma Almeira.
Moçambique é o terceiro país africano mais vulnerável aos riscos de desastres naturais (GAR 2019). Nos últimos 42 anos, registaram-se 15 secas, 20 cheias e 28 ciclones tropicais (INGD). O último foi o ciclone Freddy, afetando aprox. 800 mil pessoas quando atingiu o país duas vezes, em março e abril de 2023.
Os desastres naturais têm um impacto directo na vida das mulheres e das raparigas, tornando-as mais susceptíveis à insegurança alimentar, à pobreza e à violência baseada no género, e aumentando a sua dependência de parceiros masculinos, familiares e proprietários de terras.
“Gosto muito de vir a este hospital fazer consultas de pré-natal, nem me importo que tenha de caminhar mais de 10km para chegar aqui”, diz Luísa Neves, 21 anos, mãe de dois filhos, que está grávida de seu terceiro filho.
"Antes de ter esse hospital, se acontecesse alguma coisa grave eu tinha que caminhar dois dias e dormir na estrada no meio do caminho”, afirma Luísa.
Conselhos consultivos locais
Através do Mecanismo LoCAL, muitas comunidades como Djodjo em Moçambique têm acesso a soluções adaptativas ao clima e acesso ao financiamento climático para os governos locais, onde as próprias comunidades podem liderar a ação climática.
Isto é feito através de conselhos consultivos locais, o elo entre o governo e a comunidade. Os membros são selecionados pelas suas próprias comunidades a partir de vários estratos sociais diferentes: mulheres, homens, professores, líderes religiosos, empresários, jovens e idosos.
Através dos conselhos consultivos, as autoridades locais ouvem as vozes e as necessidades das suas comunidades na definição e selecção de infra-estruturas resilientes e serviços públicos essenciais. Estes são fornecidos pelos próprios distritos às suas comunidades, a fim de promover o desenvolvimento local sustentável e a adaptação às mudanças climáticas.
Primeiro, as comunidades locais são envolvidas naquilo que consideram ser as suas maiores necessidades, as propostas são depois encaminhadas às administrações locais e depois provinciais.
“Escolhemos a maternidade, porque quem vai dar à luz aqui somos nós”, afirma Teresa Wilson, 56 anos. “É para nós”, ela frisa enfaticamente.
Teresa é um dos muitos membros do conselho consultivo local do distrito de Chokwe, província de Gaza, que optou por priorizar a construção de uma maternidade na comunidade de Cumba, onde vive.
“Quando chovia, a comunidade ficava isolada, ninguém podia sair ou entrar na comunidade, sofríamos muito sem posto de saúde e sem enfermeiro; A minha própria mulher morreu no parto”, comenta Júlio Chave, 92 anos, membro da comunidade da Cumba e da comissão de cogestão da maternidade.
“Meu maior medo era que acontecesse o mesmo com minhas filhas, então, construir essa maternidade é a melhor coisa da minha vida. Já tenho três netos que nasceram aqui e uma bisneta”, conta Júlio sorrindo.
Os comités de cogestão garantem que as infraestruturas e serviços resilientes às mudanças climáticas sejam bem cuidados, além de garantirem a responsabilização dos governos locais.
Desde 2014, com o apoio generoso da Bélgica, da Suécia, da Suíça, da União Europeia e da Região da Catalunha, a LoCAL já beneficiou diretamente aprox. 3 milhões de pessoas no país - quase 10% da população moçambicana. O Mecanismo LoCAL sestá presente em 54 dos 154 distritos de Moçambique, através da canalização de 25 milhões de dólares directamente para os governos locais.
Cerca de 100 infra-estruturas de desenvolvimento adaptativo foram financiadas durante a implementação do LoCAL em Moçambique. Entre estas infra-estruturas, existem 33 postos de saúde e 11 maternidades, ajudando pessoas como Almeira, Luísa, Teresa e Júlio a viver vidas dignas sem medo das mudanças climáticas.